quinta-feira, 29 de outubro de 2009


escreveu, num pedaço de papel amarrotado, as palavras que lhe martirizavam a alma:

“sinto a tua falta.”

de seguida guardou-o numa caixinha dourada que outrora albergara vários pacotes de chá. escolheu a caixa do earl grey, porque lhe recordava os pequenos-almoços tomados a dois, entre bocejos e mimos.

escondeu a caixa na prateleira mais alta da cozinha, por detrás de um saco de arroz agulha. agulhas cravadas no peito, era o que sentia, pensou.

quedou-se por momentos, fixando o lugar oculto onde aquelas palavras repousariam, de agora em diante. tentou visualizar essas mesmas palavras, encolhidas na velha folha amarela, abrindo-se e libertando-se do papel, do seu peito. libertando a sua dor.

não fez mais nada nesse dia a que atribuísse tanto significado como àquele pequeno gesto.

aprendera que seria assim, por vezes, quando não conseguia abandonar um sentimento inútil. a única solução que encontrara fora a de aceitá-lo como seu, como parte integrante de si, e de guardá-lo gentilmente num recanto escondido da casa.

para que também ele, o sentimento persistente, se recolhesse a um recanto oculto do seu coração.

2 comentários:

Muse disse...

Um texto lindíssimo.

Beijinho

Jeevika Dasi/CL disse...

Adorei! E é incrivel como o coração tem recantos infindáveis...